segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

“Conhecer-se é morrer.”

A alguns meses, em um momento de angústia pessoal que não vale a pena ser dito aqui, resolvi que iria me reinventar. Isso resultou em um exercício praticamente matemático: meu nome, lista de palavras que se relacionavam comigo, ou com o que eu penso de alguma forma. Músicas e pessoas das quais escolhi para conviver, pois nossa personalidade afugenta ou atrai muitas pessoas diferentes. Por fim, uma pessoa que não vem ao caso, me emprestou o Livro Um, nenhum e cem mil, do Luigi Pirandello.

Mesmo relutante em escrever sobre as coisas que tenham realmente acontecido comigo, com receio de que isso vire um diário, o que não é difícil para alguém que faz esse exercício absurdo de decomposição pessoal. Embora todo mundo saiba que a objetividade é um unicórnio e que, portanto, não existe qualquer coisa que eu escreva aqui que não diga também algo sobre mim. Não dá para viver no outro extremo da subjetividade.  E por isso o Pirandello foi uma espécie de "tapa na cara".

Essa tal decomposição que mencionei de início, se trata de admitir que não importa o que se deixa ver. Isto é, a identidade não é uma construção puramente psíquica, algo que se dá unicamente na mente do indivíduo, mas tem a ver com os sinais que se percebem da pessoa. Isto não significa preocupar-se com como os outros nos percebem: adotar esta postura seria passar a ver o mundo como espelho. E lendo esse livro maldito (que eu já amo e odeio ao mesmo tempo) percebi que o autor se coloca justamente contra esta ideia, quando afirma que capturar-se, tentar plasmar uma imagem de si, é a própria morte. “Conhecer-se é morrer.” Não se pode viver diante de um espelho. Porque, de qualquer modo, jamais conseguirá se conhecer pelos olhos dos outros. Sendo assim, de que vale conhecer-se só para si?

E engolindo seco, percebi que, não somos nós se não indivíduos que temos a identidade forjada em sociedade. Aliás, passar a enxergar cada um de seus múltiplos uma possibilidade de si e, desta forma, se expandir desafixa sua imagem. Neste sentido, vai de fato contra a noção de uma identidade única e estática. É interessante notar que nosso eu não é particionado, mas múltiplo. E os múltiplos são as possibilidades.